segunda-feira, 29 de setembro de 2008

No centenário da morte de Machado de Assis quem morre é a língua portuguesa.

Com obras que marcaram a literatura, como "Memórias Póstumas de Brás Cubas" (1881) e "Dom Casmurro" (1900), além de diversos contos, o escritor brasileiro Machado de Assis é, para muitos, o maior escritor de língua portuguesa e um dos maiores do mundo. Hoje, 29 de Setembro, faz-se exatos cem anos de sua morte.

Machado de Assis sempre mostrou um estilo único. Com uma linguagem simples e ao mesmo tempo complexa, ele critica a sociedade de sua época e, sobretudo, o comportamento humano. Ele é considerado um gênio não somente pela literatura em si, mas também pela sua postura crítica diante de uma época com costumes ortodoxos. Em 1872, Em "Carta a Lucio de Mendonça", ele disse: "Defeitos não fazem mal, quando há vontade e poder de os corrigir". Podemos dizer que Machado de Assis era um romântico parnasiano, ou seja, um homem que sabia o que era certo ou errado de acordo com o momento e o contexto histórico.

Na nossa realidade histórica, como contraponto à genialidade do literato brasileiro, um Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em 1990, e que entra em vigor no Brasil a partir de janeiro de 2009, vai afetar principalmente o uso dos acentos agudo e circunflexo, do trema e do hífen. Segundo o Ministério da Educação, haverá um prazo de transição até o fim de 2012, em que as grafias serão aceitas em todos os oito países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP): Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe.

O Novo Acordo tem alguns pontos positivos, como a extinção do trema, que era, na verdade, uma redundância do sentido prático da escrita, e já não era usado pela maioria das pessoas. A unificação da ortografia nos países que adotam a língua portuguesa também é positiva. Porém, o contexto cultural que transforma uma grafia - com suas peculiaridades - não pode destruir, e sim construir. Sendo assim, uma língua rica de suas origens históricas, como é a portuguesa, empobrece sem querer.

Em resumo, é importante reformar a língua para sua adaptação ao cenário atual, mas também é importante valorizar suas peculiaridades históricas e sua essência. O hífen, que sempre foi o catalisador que transformava duas palavras e uma só, morreu subitamente. Exemplo: Guarda-chuva agora será guarda chuva. O hífen era o que hibridizava duas palavras em um só objeto ou idéia, o objeto guarda-chuva no caso. Pior que isso será escrever "ideia" sem acento. Já foi difícil agora: o Microsoft Word acentuou automaticamente a palavra "idéia", tive que voltar e retirar o acento. Mas nem tudo são rosas em terra de gentio. O que Machado de Assis acharia do Novo Acordo se ainda estivesse vivo?

Por : João Gabriel Rodrigues e Figueiredo.

Saiba mais: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u449713.shtml

8 comentários:

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

É raro, mas vou discordar de você em alguns pontos.
Primeiro quanto ao uso de trema que não é, de forma alguma, "uma redundância", assim como não o é, por exemplo, o acento diferencial.
Ou extingue-se a duplicidade dos sons de "gue/i" e "que/i", ou mantenha-se o trema para que, diante de uma palavra desconhecida com uma dessas sílabas, saibamos pronunciá-la sem pestanejar.
Mas é falar demais em defesa de um sinal gráfico que em breve nem existirá mais. Falando do acordo em si, a idéia ("ideia", francamente!) de abrir mão de certos acentos e de escrever calamidades como "contrarregra" nunca me agradou, confesso. Quer me parecer que parte da expressividade da nossa língua se perderá. No entanto, tenho que reconhecer os efeitos positivos disso, uma vez que uma língua universal - Esperanto ou equivalentes - não é viável, deveríamos, ao menos, buscar uma maior integração entre usuários do mesmo idioma. Da mesma forma que achamos desnecessários os "C" dos portugueses (reacção e etc) deve parecer-lhes absurdo que ainda usemos o trema, enquanto eles o aboliram há séculos. Cada um abrirá mão de algumas particularidades, em prol de um entendimento mais eficiente entre as nações "aparentadas", o que não pode ser de todo mau, especialmente numa época em que tanto se fala de globalização. O fato é que, mais que a todos, o Acordo perturba aos filólogos, os "donos da língua" pois, quanto mais difícil essa é, mais eles se destacam. // Que esse valha por todos comentários que lhe devia, Gori! haha. E bem, não poderia deixar de comentar um post com referências tão tentadoras ao amado-idolatrado-salve!-salve!-Machado-de-Assis.

João Gabriel Rodrigues disse...

Claro. O trema extremamente importante na fonética, todavia no sentido prático da língua digamos que ele é o menos importante dos acentos gráficos.

Mas o contexto do Novo Acordo não é tão ruim assim. Havia um senador (não me lembro qual) que queria abolir os neologismos. Pizza seria Pitiça. Enfim, é patético. Tanta coisa mais importante pra se discutir, como, por exemplo, a reforma tributária.

Em suma, o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa é viável em diversos sentidos. Só que o fato é: empobrece demais a gramática. Essa inculturação é insalubre à língua e às pessoas que a amam. Ouso dizer que está entre as cinco mais belas línguas do nosso pequeno planeta.

Obrigado pelas palavras, Lívia. Como sempre: explícita e sensata.

Um beijo pra você.

João Gabriel Rodrigues disse...

P.S.: Continue dando a graça de seus comentários no Cálice de Opinião.

Unknown disse...

Aldo Rebelo? Ele queria acabar com os estrangeirismos. Como "pizza" mesmo. Aliás, "pítiça" seria, por força, um neologismo.
Claro que se trata de um absurdo, afinal deve haver poucas ou nenhuma língua tão miscigenadas como o nossa, que, à imagem do próprio povo brasileiro, é fruto da fusão das mais diversas culturas. ENFIM, a idéia não é de todo insensata, há a questões a serem observadas como, para citar, o uso abusivo e não raro desnecessário de vocábulos ingleses, mesmo quando há um equivalente em Português. Sem querer soar purista demais, digo que é uma forma de elitização da língua, de restringir o acesso a ela. Se formos privados até mesmo do nosso símbolo nacional mais forte, sendo impelidos a ligar para o "delivery" pra conseguir uma "fast food", então quem somos nós? Um povo sem identidade? Deixemos isso pros canadenses. haha E eu fugi totalmente ao assunto, eu sei. É que, como já disse, nunca me agradou a formulação do Acordo Ortográfico, e considero estapafúrdio o projeto do Rebelo; é sempre bom, contudo, defender o outro lado e praticar nossa democracia interior.

Obs: sempre uma honra comentar aqui. Adoro seus textos, sinceramente! Tão bons que quase intimidam.

João Gabriel Rodrigues disse...

Exato! Aldo Rebelo. É um calhorda.

Eu não quero chamar o mouse do meu computador de rato. Mas também não quero que o entregador de pizza chegue na minha casa e diga: "Aqui está sua 'delivery', sr."

É só uma questão de senso prático. É mais simples do que parece.

Bom mesmo seria se todos tivessem como sobreviver com dignidade no mundo. Mas se assim o fosse, acharíamos absurdo. O absurdo é sempre o que não é comum. Se vivêssemos no paraíso, quereríamos "um pouco de caos". Fugi do tema também. Mas é porque não me contenho em segmentar idéias que sempre fluirão como um TODO de uma lógica óbvia - que mantém-se obscura e sem lógica alguma.

Que isso! Meus textos são comuns. Espero que eles não se tornem absurdos, se é que já não o são.

Outro beijo, Lívia.

Adriane Souza disse...

É meio incômodo perder este vício ortográfico, pois quando se aprende e se torna usual, raramente esquecemos...mas tais alterações são necessárias para a adaptação de todos. Seu texto mostra um tom de perda, mas nada está perdido...é apenas uma face diferenciada do progresso onde "a máquina se adequa ao homem".Talvez até o próprio Machado de Assis sentisse uma certa ironia nisso...

João Gabriel Rodrigues disse...

Eu já acho que "o homem se adapta à máquina", nesse contexto. Mas, são apenas hipóteses...